Recentemente a revista Saúde publicou uma reportagem abordando a relação entre alergias e depressão. Segundo a reportagem, as crises alérgicas funcionam como importantes gatilhos para os transtornos emocionais em pessoas predispostas.
De acordo com a matéria, estudos demonstram uma maior prevalência de alergias, principalmente do trato respiratório, em pessoas com depressão ou transtorno bipolar. Estes estudos sugerem que durante os períodos de crise alérgica, há uma piora no estado de humor e que o tratamento das alergias pode impedir as crises depressivas. O que a revista deixou de mencionar é que as alergias alimentares também apresentam uma relação estreita com transtornos do sistema nervoso central (SNC), podendo agravar ou mesmo desencadear o problema.
As alergias alimentares relacionadas a transtornos no SNC ocorrem, normalmente, porque alguns alimentos contêm proteínas de difícil digestão. Após ingerirmos esses alimentos, essas proteínas mal digeridas chegam ao intestino e podem escapar para a corrente sanguínea. E é aí que começa a “guerra”! Essas moléculas mal digeridas são entendidas pelo nosso organismo como um “agressor”. Nosso corpo começa, então, a atacar este “agressor”, causando inflamação e muitas vezes danos em órgãos e tecidos.
Para piorar esta guerra, algumas dessas moléculas mal digeridas são muito parecidas com células do nosso próprio corpo. Durante esta batalha, nosso organismo pode se confundir e atacar as nossas próprias células. Caso este processo ocorra no sistema nervoso central, por exemplo, pode levar a sintomas de depressão, transtornos de humor, hiperatividade, ansiedade, déficit de atenção, enxaqueca, esquizofrenia, entre outros.
Como se não bastasse isso, esses alimentos alergênicos acabam “irritando” o intestino e dificultando a absorção de diversos nutrientes necessários para o bom funcionamento do organismo. Esta má absorção intestinal pode diminuir a produção dos neurotransmissores (como a serotonina, por exemplo), já que a produção dos mesmos depende de diversos nutrientes vindos da alimentação.
Diversos estudos comprovam a elevada incidência de alergias em pessoas que apresentam transtornos neurológicos. Alguns chegam a encontrar uma prevalência de até 100% de alergias nesses indivíduos. Algumas pesquisas também demonstram melhoras de sintomas como depressão, esquizofrenia, hiperatividade, ansiedade, dificuldade de concentração e confusão mental após a retirada de alimentos alergênicos da dieta. De acordo com esses estudos, os alimentos frequentemente relacionados a esses sintomas são os que contém glúten (trigo, cevada, centeio, aveia), laticínios, clara de ovo, açúcar, chocolate e frutas cítricas. Tomate e alguns corantes e conservantes (como o ácido benzoico) também podem estar relacionados, porém, com menor frequência.
Dentre os alimentos citados, o glúten e os laticínios parecem ser os de maior influência neste processo. Além do alto potencial alergênico, esses alimentos geram substâncias que possuem efeito opioide. Essas substâncias, conhecidas como caseomorfina e gluteomorfina, interferem na atividade dos neurotransmissores no cérebro, agravando ainda mais os distúrbios neurológicos.
Algumas pesquisas também demonstram que o glúten pode prejudicar a circulação, diminuindo o fluxo sanguíneo para o cérebro. Com menos sangue circulando em nosso cérebro, é como se estivéssemos “ligados” em uma voltagem menor. Isto pode desencadear apatia, letargia, dificuldade de aprendizado e concentração ou até mesmo agravar transtornos de humor importantes, como os já citados.
Mas não espere que ao ingerir estes alimentos, os sintomas apareçam imediatamente. Este tipo de alergia, conhecida como alergia tardia, pode desencadear sintomas até 4 dias após a ingestão do alimento, o que dificulta ainda mais a identificação dos “culpados”. Além disso, as reações podem variar de acordo com a individualidade de cada um. Assim, é essencial procurar um profissional capacitado a fim de auxiliar no diagnóstico e tratamento dessas alergias, que poderá identificar com precisão qual ou quais são os alimentos alergênicos para cada indivíduo.
Não se surpreenda, portanto, se daqui a alguns anos, o tratamento nutricional fizer parte da terapêutica para depressão e outras desordens neurológicas. Como visto, alimentação e emoção têm tudo a ver!
* Texto elaborado pela Dra. Gisele Pagliarini Silva, aluna bolsista do curso de Pós-graduação em Nutrição Clínica pela VP Consultoria Nutricional/ Divisão Ensino e Pesquisa.
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